A poesia revolucionária das décadas de 70 e 80 mantém-se afastada da castiça naturalidade de João de Deus, do mesmo passo que da própria realidade quotidiana portuguesa. João de Deus deixou-nos poucas e breves sátiras políticas e sociais; mas, por exemplo, as três que citámos são excelentes pela sua exacta apreensão de factos característicos. Se lhes falta grande fôlego sintético, são, em compensação, inexcedivelmente fiéis ao bom senso popular.
O carácter pretensamente social do revolucionarismo literário de 70-80, a sua ligação com as aspirações bastante vagas e contraditórias da população descontente, denuncia-se claramente na incapacidade, que normalmente manifesta, de digerir perfeitamente os modelos franceses, assimilando-os às condições portuguesas; e no cunho em geral retórico e abstracto da sua expressão literária, destinado a iludir a sua impotência ou as suas contradições reais - nomeadamente quando às imagens de uma camada de espoliadores farisaicos e devassos opõe com insistência uma imagem inconscientemente caricata do povo, que esses poetas só conseguem ver envilecido, degenerado, física e moralmente atrofiado pela miséria.
É, por exemplo, significativo que todos os poetas revolucionários aceitem tão amiúde a designação de canalha para o povo, embora com ironia e chamando-a também a si.
As Odes Modernas fixaram muitos dos elementos oratórios dessa poesia, nomeadamente as suas abstracções de matiz religioso ou metafísico, a tendência proudhoniana para situar na consciência, e portanto no apostolado pedagógico e literário, os meios mais eficazes para operar qualquer transformação que melhore a condição humana.
Vítor Hugo forneceu, como temos dito, o principal figurino versificatório e estilístico para revestimento destas concepções gerais. Mas, como também notámos, foi a um Baudelaire mal (ou negativamente) entendido, se não conhecido em segunda mão (e até sob a forma de caricatura, no satanismo de um pretenso Fradiques Mendes, autor dos Poemas de Macadam publicados n' O Primeiro de Janeiro), que poetas panfletários portugueses de então foram buscar a imaginaria da podridão das urbes burguesas modernas. Distingue-se, neste sentido, o papel desempenhado por Guilherme de Azevedo (n. Santarém, 1839-11-30 - f. 1882-04-08).
Fisicamente mal dotado, ocultando a todos, desde os 14 anos, uma chaga incurável de que morreu aos 43, com uma infância dura, os estudos suspensos ao findar o curso liceal por incompreensão do pai, Guilherme de Azevedo revelou desde cedo uma clara simpatia pelos revoltados.
O seu primeiro volume de versos, Aparições, 1867, nada acrescenta ao lirismo amoroso romântico e ao vago progressismo já então consagrado na nossa poesia; mas anos depois, como redactor de um jornal da sua terra, Santarém, escandaliza quase todos os assinantes com uma apologia, aliás vacilante, da Comuna de Paris. A partir de então fixa-se em Lisboa, onde publica os seus principais livros, Radiações da Noite, 1871, e Alma Nova, 1874 (3.a edição 1981), e faz a sua vida no jornalismo, especialmente no folhetim humorístico, devendo salientar-se a sua colaboração na revista "Ocidente" e aquela que prestou ao António Maria e ao Álbum de Glórias de Rafael Bordalo Pinheiro, que tiveram uma enorme projecção no tempo.
Tentou também, sem êxito, o teatro, escrevendo, de colaboração com Junqueiro, a Viagem à roda da Parvónia, sátira social e política em forma de revista (1878). Viveu os dois últimos anos em Paris, como correspondente de um jornal brasileiro.
O carácter pretensamente social do revolucionarismo literário de 70-80, a sua ligação com as aspirações bastante vagas e contraditórias da população descontente, denuncia-se claramente na incapacidade, que normalmente manifesta, de digerir perfeitamente os modelos franceses, assimilando-os às condições portuguesas; e no cunho em geral retórico e abstracto da sua expressão literária, destinado a iludir a sua impotência ou as suas contradições reais - nomeadamente quando às imagens de uma camada de espoliadores farisaicos e devassos opõe com insistência uma imagem inconscientemente caricata do povo, que esses poetas só conseguem ver envilecido, degenerado, física e moralmente atrofiado pela miséria.
É, por exemplo, significativo que todos os poetas revolucionários aceitem tão amiúde a designação de canalha para o povo, embora com ironia e chamando-a também a si.
As Odes Modernas fixaram muitos dos elementos oratórios dessa poesia, nomeadamente as suas abstracções de matiz religioso ou metafísico, a tendência proudhoniana para situar na consciência, e portanto no apostolado pedagógico e literário, os meios mais eficazes para operar qualquer transformação que melhore a condição humana.
Vítor Hugo forneceu, como temos dito, o principal figurino versificatório e estilístico para revestimento destas concepções gerais. Mas, como também notámos, foi a um Baudelaire mal (ou negativamente) entendido, se não conhecido em segunda mão (e até sob a forma de caricatura, no satanismo de um pretenso Fradiques Mendes, autor dos Poemas de Macadam publicados n' O Primeiro de Janeiro), que poetas panfletários portugueses de então foram buscar a imaginaria da podridão das urbes burguesas modernas. Distingue-se, neste sentido, o papel desempenhado por Guilherme de Azevedo (n. Santarém, 1839-11-30 - f. 1882-04-08).
Fisicamente mal dotado, ocultando a todos, desde os 14 anos, uma chaga incurável de que morreu aos 43, com uma infância dura, os estudos suspensos ao findar o curso liceal por incompreensão do pai, Guilherme de Azevedo revelou desde cedo uma clara simpatia pelos revoltados.
O seu primeiro volume de versos, Aparições, 1867, nada acrescenta ao lirismo amoroso romântico e ao vago progressismo já então consagrado na nossa poesia; mas anos depois, como redactor de um jornal da sua terra, Santarém, escandaliza quase todos os assinantes com uma apologia, aliás vacilante, da Comuna de Paris. A partir de então fixa-se em Lisboa, onde publica os seus principais livros, Radiações da Noite, 1871, e Alma Nova, 1874 (3.a edição 1981), e faz a sua vida no jornalismo, especialmente no folhetim humorístico, devendo salientar-se a sua colaboração na revista "Ocidente" e aquela que prestou ao António Maria e ao Álbum de Glórias de Rafael Bordalo Pinheiro, que tiveram uma enorme projecção no tempo.
Tentou também, sem êxito, o teatro, escrevendo, de colaboração com Junqueiro, a Viagem à roda da Parvónia, sátira social e política em forma de revista (1878). Viveu os dois últimos anos em Paris, como correspondente de um jornal brasileiro.
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