segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

O Realismo segundo Eça

Que é, pois, realismo? É uma base filosófica para todas as concepções do espírito – uma lei, urna carta de guia, um roteiro do pensamento humano, na eterna região do belo, do bom e do justo. Assim considerado, o realismo deixa de ser, como 4lguns podiam falsamente supor, um simples modo de expor – minudente, trivial, fotográfico. Isso não é realismo: é o seu falseamento. E o dar-nos a forma pela essência, o processo pela doutrina. O realismo é bem outra coisa: é a negação da arte; é a proscrição do convencional, do enfático e do piegas. É a abolição da retórica considerada como arte de promover a comoção usando da inchação do período, da epilepsia da palavra, da congestão dos tropos. É a análise com o fito na verdade absoluta. Por outro lado, o realismo é uma reacção contra o romantismo: o romantismo era a apoteose do sentimento; o realismo é a anatomia do carácter. É a crítica do homem. É a arte que nos pinta a nossos próprios olhos – para nos conhecermos, para que saibamos se somos verdadeiros ou falsos, para condenar o que houver de mau na nossa sociedade.



Eça de Queirós, 4ª Conferência do Casino




(A reconstituição desta conferência foi feita por António Salgado Júnior. O texto original perdeu-se).

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